Editorial - 7ª edição

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* Para acompanhar o lançamento dos próximos números da Palavril, envie um email para: palavril@gmail.com





NA ESTAÇÃO

Revelações do calendário
lembranças do tempo
as rugas descortinam
rabiscos da insônia
uma música desconcertante
um ponto ou uma fuga.

Almandrade



EU SOU FUGAZ


Eu sou fugaz
Como um bandido
Como um ladrão
Um ato de contravenção
Eu sou fugaz
Como um momento
Um movimento
Uma explosão
Eu sou fugaz
Como o gozo final
Como três dias de carnaval
Uma chuva de verão
Eu sou fugaz
Como o desejo
Pura paixão
Sou fugaz
Como a dor de quem berra
Como um suicida
Em pronta queda
Uma injeção
Sou fugaz
Como um cigarro
Uma brisa
Uma última cena
Sou fugaz
Como um verso
Uma rima
Fugaz
Como um poema

Bruno Borja




PAPÉIS ENVELHECIDOS

Cabeça marginal
Nos becos escuros
Sussurros sem nexo
Alucinações
Cabeça marginal
Papéis envelhecidos
Com poemas vencidos
De tanto se gastarem
Nas noites sem fim
E cacos de sentimento
Esquecidos no cinzeiro
Se desfazendo
Com o artesanato do tempo

Cabeça marginal
Livre para ser
Presa em si mesma
Em fumaças sem sabor
Em neblinas de amor
Amor gasto, amor sofrido
Sob um céu escurecido
Pois as estrelas dormiram
Já não se sentindo cúmplices
Do olhar tão embaçado
Dos arcanjos sem destino
Anjos rebeldes sem asas
Chorando na terra, sem som
Cabeça marginal entre as sombras
Perfume sem aroma
Música sem tom

Giulia Drummond Battesini



“El viaje no ha sido corto hasta aquí”


Un tren de 57 vagones
con 56 clausurados
al menos por la biología

Entraré, doméstico
(y confluiré
y lo adoptaré
y lo encarnaré)
en el vagón 58

No diré:
“El viaje hasta aquí
ha sido largo”

Rolando Revagliatti (Argentina)


Peixes

(pura invenção a vida não é tão perfeita quanto uma canção)
um quadro
retrata peixes nadando
o mar é real
o azul confunde sensações
como quem embaralha cartas
ou como quem criou uma ilusão muito particular
podemos sentir a brisa marítima
tocaremos os peixes desobedecendo aos cartazes.
(é expressamente proibido tocar nas obras de arte)
seguiremos pela manhã tocando nos peixes
sentindo a brisa que nos beija
delicadamente suavemente
(pura invençãoa vida não é tão imperfeita quanto um poema).

Flávio Machado


Em Belo Horizonte

Trago a cidade
E meu peito
Cansado
Cospe o câncer.

Absorvo toda química
Ladeiras
Me deito na praça.

Aos domingos
São tantos domingos
Caço uma feira
Haja cachaça!

Me encanto com a missa
Um padre com sono
Um bêbado em pé
Nenhuma menina.

Finjo não ver o dia passar
Encarno um mineiro
Encaro um tropeiro
Enrolo um na palha
E fico a pitar.

Renato Limão


Cataversos - 1 ano de (in)ventos poéticos

por Carlos Elvin



Há quem diga que "foi amor a primeira poesia".
Disse-me-disseram a parte, o que todos confirmam mesmo é que após o encontro propiciado pela oficina de poesias Exprima-Me, no Sesc-Tijuca, "aqueles três não se largaram mais"...

- Começamos a nos encontrar de duas a três vezes por semana, foram muitas conversas, muitas idéias, líamos nossas poesias um para o outro, buscávamos correlações, a gente queria montar um projeto, alguma coisa diferente, trabalhar artisticamente uma apresentação de poesias -conta Marcelo.

Nascia o grupo Cataversos – (In)venta Poesias, formado por Alex Topini, Diego Tribuzy e Marcelo Felippe, que agora em setembro comemorou um ano de vida, com o propósito artístico de investigar linguagens e experimentar formas do fazer poético, trabalhando na dramatização performática das suas poesias, colaborando na construção de novas ferramentas para o exercício da poesia falada, contemporânea e urbana.

- Os primeiros encontros se deram em julho, mas nossa primeira apresentação foi em setembro, daí escolhemos esse mês para aniversário do grupo.
A característica marcante do Cataversos reside no fato do grupo além de assinar texto e direção artística do seu próprio trabalho, também se propor à auto iluminação no palco, através do uso de lanternas, velas, flashs, neon, dentre outros artifícios luminosos, alternando penumbra e breu total, operando cortes seqüenciais, estruturando suas apresentações, assim, através de uma edição viva.

- O desafio era, de um lado, criarmos uma apresentação dramatizada de poesias, que tivesse um mínimo de rigor e elaboração estética, e do outro, nos criarmos enquanto um grupo, com uma identidade, um diferencial, um recorte bem definido, afirma Alex.

Quando perguntados sobre a convivência e o trabalho em grupo, é o Diego quem dispara:
- Somos pessoas muito diferentes, e até mesmo com poéticas muito diferentes, eu diria, mas ligadas pelo desejo comum de fazer um grande trabalho, algo que nos envaideça mais ainda do que já somos(risos).
- E todos nós somos extremamente críticos em relação ao grupo, a performance, estamos sempre mais insatisfeitos do que o contrário, temos referências e trajetórias diferentes, eu mesmo até bem pouco tempo só me apresentava como músico...confidencia Marcelo.
- Sempre alguma coisa é abandonada, descoberta ou reelaborada a cada apresentação, já nos apresentamos umas quinze vezes, e nunca foi igual, e quando digo que nunca é igual, estou falando de forma objetiva, a performance sempre muda em alguma coisa na sua estrutura...conta Alex.
- É, ficamos praticamente um ano criando e recriando um mesmo quadro...por mais que a cada nova apresentação muita coisa estivesse diferente...acho que agora, por mais que sempre haja pequenas mudanças, ou partimos dele para uma coisa maior, uma segunda parte, ou começamos um novo trabalho do zero, pontua Diego.

Eles estão se referindo a performance Versos na Câmara Escura, que se desenvolve numa progressão quadro-a-quadro, através de uma seqüência de cortes propiciados pela alternância plástica entre a penumbra e o breu.
São evocados, através das poesias, temas ontológicos da condição humana, como a existência, a solidão, o amor e a morte.
Numa perspectiva híbrida, temos um teatro de imagens, sons e palavras, articulados através de contrapontos e interpenetrações do jogo poético, expostos/sub-expostos na tênue fronteira entre a luz e a sombra.

O Cataversos se apresentou recentemente no teatro Carlos Gomes, participando do Mercadão Cultural - Festival Nacional de Esquete e Performances, e no dia 20 de dezembro se apresentará na Casa França Brasil,por ocasição da abertura da exposição dos trabalhos premiados no projeto UniversidArte.
Ainda esse ano a performance Versos na Câmara Escura será apresentada também no Sobrado Cultural, no Festival da Primavera, na PUC, e na Mostra Livre de Arte(MoLA) do Circo Voador.

- Um ano de grupo se foi. É um momento de alegria, mas também de balanços. Queremos criar e nos recriarmos permanentemente... estamos amadurecendo, experimentando e pesquisando.. e cada coisa que aprendemos sempre põe em crise o que fazemos... vejo mais embasemento crítico do grupo em relação ao trabalho que desenvolvemos, chegou a hora em que só intuição e bom senso não são mais suficientes, coloca Alex.
- Até o final do ano vamos continuar apresentando a performance Versos na Câmara Escura. Vamos lançar ainda nossa logo e o site Cataversos, e se der, nosso primeiro livreto conjunto e um cd com nossas poesias que integram essa performance, musicadas, sonorizadas, com a banda Mysticow, que nos acompanha no palco. Tudo isso está em andamento, apesar dos mil compromissos de cada um de nós. Se encerrará um ciclo, depois nem nós mesmos sabemos bem ao certo o que será, revela Marcelo.
Amigos e fãs do grupo aguardam ansiosos pelas novidades anunciadas, como o livreto, site e cd.
Que o Cataversos resista ao tempo, a todas dificuldades encontradas por um projeto que segue sem apoio institucional ou mesmo patrocínio, sem sequer possuir um local adequado para ensaios.
Parabéns ao grupo, e que daqui a um ano possamos dizer dois, e depois três, e quatro e mundo a fora (in)ventos de poesia.




A TARDE

por Diogo Henriques


Até poderia ser uma tarde de angariar praia e cerveja. Mas a descida da feirinha aglutinava uma multidão que não desempenhava papel. Sim, podíamos constatar o suor no rosto da garota grávida parada, escorando-se ao um poste na esquina da quadra; lá dentro, o calor era maior. Senhoras podiam ser vistas com seus netos e velhos caquéticos de trinta anos rastejavam rapidamente exibindo sorrisos rugos. Achava-se ali, por volta do meio-dia, os tropeçados e também os caídos. A boca continua aberta. A praia devia estar lotada e feliz. Aqui estamos numa cadeia montanhosa que a gente sem oportunidade do início do século passado foi viver. Agora era uma das mais perigosas e miseráveis comunidades e respondia pelo nome favela.


O DENUNCIADOR

- X9 vai morrer, X9 vai morrer...- as crianças subiam saltitantes pela viela cantando.
Ah, e eu que vos chego, sou um homem qualquer, já passei por esse suplício. Eles ainda vão brincar muito com esse rapaz que está preso ridiculamente com fita crepe. Poder se soltar ele até pode, mas por quê? Ficar lamentando uma morte mais leve, implorar para deixar sua mãe chegar, conversar um pouquinho com ele antes da sua morte; pegar na mão, rezar o pai-nosso com ela, é o melhor que ele pode fazer, e o cabível.


NOSSO PÚBLICO

Não é mesmo uma multidão, é um montículo de gente, os mais afastados com certeza são os que estão pancados. Um único cigarro de maconha aceso; estalando as sementes a cada gigantesca baforada puxada. Era Neco, empunhando uma gasta e simples pistola. Baforrava também. Ele que vai matar o X9. Eu aqui cheguei foi de Blaizer, largado pelos vermes, depois de apontar quem eu apontei. Traí e fui traído. Com dois tiros para cima a arma foi entregue à cabeceira de um palanque, usado no baile. Neco então se deixou desarmado. Pareceu menos jagunço. Sentou. Moreno um pouco magro, metro e setenta, boné da Nike na cabeça. Uma morena linda saiu do público e pousou na sua coxa. Encostou os lábios no conhaque e aquietou-se. E o mundo ficou em silêncio por muitos minutos.


DEJA VU ou REWIND?

O som da cachoeira, o quintal da minha casa! Eu cresci junto ao rio e amei ainda mais a minha liberdade quando saí de cadeia. Cinco anos pegado. Eu não ia ficar de novo não. De tanto lembrar da minha vida solta quando estava preso e tanto lembrar da minha vida presa quando estive de novo solto, apelidaram-me de Passado. E eu morri querendo um banho na cachoeira natal. Passei suplício, mas não supliquei, não senhor. O Neco devia-me uns favores. É claro que me matou. Aqui no morro ou é queimado ou é esquartejado. Eu pedi pra ser esquartejado, pois sabia que se morre mais rápido dessa forma, e ele atendeu, graças a Deus. De qualquer forma nos meus últimos segundos de vida eu já delirava alucinadamente. Faz uns tempos isso. Que eu morri.



VEREDICTO

Num levante o carrasco saiu do seu estado de imobilidade e com um movimento ágil e vigoroso raspou o cano da Imbel no chão da quadra criando fagulha e despertando o formigamento dos horríveis pedintes de carnificina. O cochicho cabuloso de geral, nosso público presente, era de um terror de manchar com sangue o dia lindo.
- Vai lamber em fogo – um disse.
- Safado – em fúria um outro.


A MÃE E O FOGO

A mãe chegou em prantos. Desde a entrada foi caminhando de joelhos até o filho padecente. Ao filho nunca faltou muito até. E ele tão arredio, sempre preferiu perambular, ficar dormindo nas ruas. Cheirando cola. O nome do moleque era Wellington Amaral da Silva. Wellington já estava todo babado, os olhos vermelhos e o corpo vergado de tanto chorar.
Veio Neco, o fogo, e Wellington ardeu com cachaça.
- Quero eu saber de simpático, filho-de-uma-puta – disse Neco olhando para o X9.
- Arde! – gritou.
Por instantes essa mulher próxima ao corpo que tremulava parvidamente esqueceu seu aniversário. Será hoje seu aniversário? – pensou. Wellington queimará durante o tempo que ela o velar.


NECO

A cocaína que brotava na dobra da nota de um real reluziu e conduziu Neco de volta para a boca, de volta para sua pistola. Sua vontade sempre foi ser caçador. Matador de homens. Sim, pensava, o peito inchado, eu sou o tenente dessa porra. Tenente é maior que coronel. Eu sou tenente dessa porra, disse só para si. Lábio molhado de conhaque. Mãos cheirando a cachaça.



PROJETO AR DUO
por Fernanda Antoun e Alex Topini

COSTUREIRINHA

coser os homens à vida
à casa
saia dos dias
barra do tempo
o silêncio
coser o canto
a manga
o nó
modelar a fibra
ponto-a-ponto
cada peça
entre sobras o justo
o raso, o vôo
mesmo que o novelo estéreo
ainda que agulhas estanques
a ferida calo
ave lã




Poesia cênica: reflexo dos novos tempos?

por Marcos Fiuza

Acredito que, nos dias de hoje, após o advento da modernidade, a sociedade sofreu e vem sofrendo transformações impressionantemente rápidas. O ritmo de vida da “urbe” está cada vez mais acelerado, sendo difícil o acompanhamento. Como pensar, dentro dessa perspectiva, uma poesia que se torne atrativa a um público de “não-iniciados”? Talvez a forma tradicional, do “papel e tinta” não esteja mais sendo suficiente para captar a atenção de leitores em um ambiente repleto de informações “vivas” (refiro-me aos diversos meios eletrônicos que se apresentam facilmente a população). Desse modo, seria a “monotonia” de um poema o seu pior inimigo? Sinceramente, acredito que não. A apreciação de um poema é, e acredito nunca deixar de ser, uma experiência única e particular. O contato entre o leitor e o poema acarreta uma subjetividade ilimitada e insubstituível. Porém, no intuito de captar olhares ao seu trabalho e, também, trazer dinamicidade a apresentações públicas, novas formas apresentam-se buscando espaço no cenário artístico.

Pensando nas diversas formas poéticas que se manifestam em nossos tempos, deparo-me com o que alguns vão chamar de “poesia cênica”. Esta performance artística que mistura formas, em princípio, tão distintas (teatro e poema), vêm, realmente trazendo novos olhares e novas maneiras de se pensar a poesia. Como enquadrar esta nova produção artística dentro de escaninhos já corroídos pela ferrugem? Seria a hora, talvez, de pensar os rumos tomados pelas manifestações artísticas contemporâneas. Será que num futuro próximo não haverá mais espaço para o “tradicional”?
Bom, a questão é esta e, realmente, não tenho respostas a dar. Acredito que, mais importante que respostas, são as incertezas, pois a partir delas que podemos pensar, concluir e desconstruir.
Mais que buscar julgamentos imaturos, tentando comparar gêneros que acredito serem distintos, enquadrando este ou aquele em “bom” ou “ruim”, tentei trazer algumas indagações, que longe de qualquer afirmação, trazem-me dúvidas e colocam-me dentro de uma perspectiva nova e instigante. Assim, espero, a partir destas modestas considerações, contribuir para a discussão e atentar para os novos rumos que a crítica artística, especificamente literária, deve tomar devido às imposições dos novos tempos.

* Marcos Fiuza - Poeta, professor e pós-graduando em Literatura portuguesa e literaturas africanas de língua portuguesa - UFRJ mvfiuza@yahoo.com.br



Daiálogos Jandaias – Partido 1
por Rod Britto


Então, mano. Confere que em São Paulo a coisa não tá pra arruaças, chopinho, não coisa nem nada, se comparado com o Rio. O que é que é? Sim, é São Paulo, vá dar uma guinada na tua amarradação de páginas, folhas-secas, não fica pra bancar de trouxa, não. Com os nossos insofismáveis preconceitos, refratores do bem, lançamentos pras laterais, paulista é só cuzão. Ponto de muxoxo. Só pra um soprinho o Movimento da Poesia Maloqueirista, tudo mano de lá de Sampa, chopinho, massa, então, produtores e divulgadores da tsunâmica Revista Não Funciona. Massa. Os mandamentos ideais ao novo contorno do canto do mundo: Renato Limão, Pedrinho Tostes, Berimba de Jesus (novamente citado? Não, Editor; não estamos nos comendo, uma pena) Caco Pontes, Jerry, Sergio Vaz, Robson Canto, mais a gente lá da, dá-lhe Cooperifa neles, os inválidos e invalidantes burgueses, como são lindos ricos como são ricos os burgueses, intertextualidade como caetânicos. Pra eles, os infratores do bem, maloqueirismos. Objetivos de mercado à parte: na lata, toma! cruzando a Brigadeiro com a Paulista, como se elas se cruzassem numa boa...
Ah é! Que carinha inoportuno este croníssoro, é desvio público ele! Sangrias. Vá tomá banho, infeliz! Cê... (Caetano de novo, porque lembrou São Paulo, e a banda novíssima, pois não, croníssara). Rodi o quê? Cê tá se achando o que! Só sabe gastar encima do Rio de Janeiro e é bem verdade que não consegue se livrar desta cidade, viciado como ela! Furta rapidinho lá pra São Paulo, quem sabe até como enviado da Palavril, bisão!, bancado na fita, e volta mavioso, ainda pilhando mais, mensaleiro, sanguessuga, nada próprio do palavrear. E a nossa cidade, cá estamos. Ame-a ou deixe-a, seu putinho, chopinho, massinho, o caralho, que seja! É só largar, porra. Vá logo pra morar de vez, não volta, que aqui tem Palavril, tem Filé, boa escrita tamém tem, ora ora... Rod, por favor, não sou eu quem está dizendo isto, afinal, na Revista Palavril, temos mensagens dos leitores, e não são poucas, não – afinal, nós dois eletronicamos entre brancos e pretos, mas nos entendemos muito bem, há quem diga já que temos qualquer firma e as polêmicas sejam inventadas, que absurdo pensar isso.
Absolvidos. Absolvidas igualmente as cidades, paz entre as taperas, mocambos e malocas, cada qual e as suas facções, pobre, punguista e marginal é igual em tudo quanto é lugar, somando as dificuldades intrínsecas, os bolsões, não funcionam... Mais ou menos mentira. Dessa vez como nas outras, tomo partido e pt saudações. Ai, ai, e é tão bom produzir está croníssara trocando de governos. Partido que estou. Até quem lê mais livro bandida mais eficiente. Um vril no celular.
Deixo pra terminar esta Croníssara com um desenho monstruoso do grafiteiro de Sampa, o maloqueirista Jerry Batista, que espanca por lá, além de gente boa até pra quando morrer. Fodão o cara, mas não tenho o desenho dele, não. Afinal não vem tudo isso da combinação com as alvíssaras? Deu (e esse finzeco é gaúcho, lá dos... seu). Com os retoques feitos necessários, o Editor, A. Topini.

* Rod Britto é jornalista e editor gratoporlembrar@gmail.com






PREFERÊNCIA PRETERIDA

perdi vários eus pelas ruas
em que não entrei
e guardo
um mapa estrangeiro
somente
por vício
de documentos

às vezes copio
na pele
teu nome sem endereço
e a fria esfera sem tinta
põe em seu risco meu sangue
que o coração
gerencia

Carlos de Hollanda



Veloz

na contra-mão das palavras,
encontro os sons.
Lá está a alma, pedaço de alma
virgem que não conquistei,
que não junta letras,
que nem sílaba é.
É o que a escrita toca em mim.
Um acorde rascante, repetitivo, insistente,
que perfura sentenças
até encontrar o que preciso.
Preciso não é e nunca será.
Navegável, transitório,
marulhento SOMMM.

Maristela Tridade



Passaporte astral

Transforma a morte em transporte
(e) pensa no corte
(da) hora do parto
passaporte pra vida
Morte é sorte na hora certa
cria heróis, dor, esquecimento
e finalmente
trânsito livre pelo firmamento
total domínio do ser
independente da matéria terra
Pacientemente
espera a hora e retorna
transforma sabedoria em lapso
e fica a um passo do renascimento
escolhe a missão e esquece
és livre-arbítrio
Reinício do ciclo
e transforma a morte em degrau
única certeza natural
passaporte astral

Diego Tribuzy



“MPB”

Quando eu ouvi
era o Jackson do Pandeiro,
João do Vale, Dominguinhos...
tinha outra divisão.
E era Zé Limeira,
repentista, rap-solto,
hip-hop de terreiro...
transfusão de Gonzagão.
Quando eu ouvi
era um lance meio estranho,
era samba, era black
e navegava no baião.
Não era bem barroco,
tinha um baque-meio-solto,
era frevo, torto-choro,
turbinado feito avião.

Euclides Amaral



Pensamento Maquinalista

Por que se importar com pessoas?
Se são todas iguais, todas
Copiáveis, capazes de gerar
Outro ser, com suas iniciais.

Por que se importar com o mundo?
Se este, também é artificial,
Criado par gerar uma dose de
Felicidade sobre esses animais.

Como digo para um amigo meu
Na vida, nada se cria.
Nem se copia, se reproduz
Instintivamente.

Vinicius Longo



Essa Ambulante
Eu prefiro ser
Metamorfose
A terFormada
Sobre tudo
AquelaOpinião Velha
Formada sobre tudo.
Não quero ser
Escravo
Das idéias espalhadas
Não quero arrumar
As estantes da desordem
Não quero precisão
Nas idéias em questão
Abaixo o alternativismo
EscravismoTradicional
De parâmetros
Do distinto
Abaixo o estereotipo consumismo
Do simplismo
Abaixo o nacionalismo
Egoísmo
Elitismo
Do proletário
Abaixo o feminismo
O machismo
O esquerdismo
O socialismo
De mentira
Conceitos se esvaíram do meu ser
Antes que eu pudesse perceber
Antes que eu notasse
Tudo o que me foi
Retirado.
Retirem de mim o que for nescessário
Eu prefiro ser
A porra da metamorfose ambulante
Do que ter aquela merda de opinião
Formada sobre tudo

Joana Barros




Amanda Petardo
por Dan Soares

Amanda Petardo é uma pantera caótica, o alicerce de todas as paixões possíveis.
No dia em que a conheci, foi tesão à primeira vista, eu nunca havia visto um espectro com tal aspecto.
Ao dar de cara com essa fera mitológica, górgona dos olhos azuis, todo homem é tomado por um estranho estado de estupor não-estipulado.
Diante da improbabilidade de tê-la como propriedade, cientes da impossibilidade de possuí-la por completo, hordas de investidores se contorcem num desespero wallstreetiano.
Nada a compra. Homem nenhum conquistou nem vai conseguir conquistar o coração e alma dessa top-model-pop-rock-star, Amanda escapa por entre seus dedos, tal qual uma lavadeira a voar veloz.
Pasmos com sua auto-suficiência, sua ignorância, seu coração de aço, filósofos e boêmios especulam em rodas de bar - de onde Amanda vem, pra onde Amanda vai?
Será que existe vida após Amanda, será que existe Amanda após a morte? Será que Amanda tá com encosto, será que Amanda é o Anticristo? Será que Amanda veio ao mundo somente para partir os pobres corações de jovens poetas românticos da Zona Sul como eu, ou será que Amanda é só mais uma ingênua Julieta, à procura de seu Romeu?



A Poética Nordestina de Ascenso Ferreira
por Gilfrancisco


Apoiado inteiramente no manancial rico do folclore nordestino, declamando e cantando seus próprios versos, Ascenso Ferreira escolhe para temas de seus poemas assuntos populares: festejos religiosos, lendas, acontecimentos da sua região. Esse poeta pernambucano se notabilizou pelo ritmo excelente dos seus versos, que evitam o resvalar para a prosa e para o lugar comum. Portador de uma pequena bibliografia, isso não impediu, contudo, que o poeta alcançasse uma popularidade extraordinária, de norte a sul do país. Ascenso morreu quatro dias antes de completar 70 anos, em 1965, e sua obra se perdeu, a partir daí, no mais terrível silêncio. Por isso continua desconhecido do público brasileiro, apesar do compositor e cantor Alceu Valença, responsável por sua redescoberta, ter musicado e gravado vários de seus poemas: Maracatu; Oropa, França e Bahia; Vou danado pra Catende, dentre outras.

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Ascenso Ferreira deixou obra escassa porém expressiva: Catimbó (1927, 2ª ed. 1929), Cana Caiana (1939); em 1951, publicou uma edição de luxo de Catimbó, Cana Caiana e Xenhenhém, acompanhada de um LP com melodias para os poemas reunidos (primeiro poeta brasileiro a gravar seus poemas em disco) e com prefácio de Manuel Bandeira. Em 1963, no Rio de Janeiro, teve editado Catimbó e Outros Poemas, com prefácio autobiográfico. No final de 1995, 32 anos depois da edição comercial mais recente, os poemas de Ascenso Ferreira foram finalmente relançados em cuidadoso trabalho da Nordestal Editora, dirigida pelo crítico e poeta pernambucano Juhareiz Correya, em co-edição com a Fundação de Arte de Pernambuco – Fundarte.
A nova edição dos poemas de Ascenso Ferreira, reproduz ilustrações de Carybé, Cícero Dias, Joaquim Cardozo e Luis Jardim, entre outros, com textos introdutórios, que já se tornaram clássicos, assinados por Manuel Bandeira e Sérgio Milliet. Catimbó, o primeiro dos três livros, é prefaciado por Ritmo Novo, um pequeno ensaio de Mário de Andrade. Cana Caiana tem um texto de apresentação assinado por Luis da Câmara Cascudo. Xenhénhém é apresentado por um artigo assinado por Roger Bastide.
Sua obra apresenta-se em duas fases: uma da época parnasiana, sob a égide do Grêmio de Palmares, sem grande marca, e a outra, a modernista, resultante dos contatos com elementos da massa rural. Ascenso Ferreira, integrou-se ao movimento modernista de 1922, através do grupo da Revista do Norte (PE), sem contudo, influenciar por nenhum dos grupos. Ou seja, do Pau-Brasil, de Oswald de Andrade, ou do Verde-amarelo de Cassiano Ricardo e Menotti Del Picchia, nem igualmente da chamada ala futurista.
Joaquim Inojosa, teria sido, igualmente um dos incentivadores de Ascenso Ferreira no sentido de adotar o modernismo, mas a sua resposta não se fazia em termos de uma influência futurista. Foi à conferência do poeta paulista Guilherme de Almeida, pronunciada no Teatro Santa Isabel, em 1924 e a recitativa de seu poema “Raça”, abriu os olhos de Ascenso à possibilidade de novas estéticas. Mas, foi o poeta Benedito Monteiro quem maior influência exerceu na sua transformação, sem esquecer José Maria de Albuquerque Melo e Joaquim Cardozo. Desta forma, Ascenso cria um, estilo novo de poesia, resultado não só de seu tipo vivencial, como da profunda integração com a literatura oral do povo nordestino.

...Continua na próxima edição...

* Jornalista, pesquisador e professor universitário



Personagem- parte 5
por Aguinaldo Ramos

Leme


O mar
se não o procuram
desespera-se.
Não é difícil
vir buscar em terra
um desafio.
Esbraveja de espumas
espalha as areias
revira inertes os barcos...
Quando se enche de estática,
quase sem ar, condicionado,
Personagem se dispõe
às infindáveis dúvidas das ondas,
sabe bem que precisa apaziguar
uma fissura oceânica.
Ao acolhê-lo, o mar, grato, se acalma
e o envolve num cardume de brilhos.
Mas Personagem tem outros marulhos...
Embarca porque tem conquistas a fazer.
Não do mar.
Nele seu peso é só de uma gota...
Personagem vai ao encontro do mar
(qualquer mar...)
quando é necessário
reassumir seu leme.


Passante

As formas aprenderam dos homens.
Seguiram as regras,
marcaram compassos,
riscaram esquadros
e, de certa forma,
em certos ângulos,
tabela.
Cresceram
em expansão uniforme
dos lotes aos prédios
dos pisos às casas
das estradas às ruas
do campo às cidades.
Tudo muito concreto,
aparentemente sólido.
As formas espalharam
pesado volume de poder
sobre tudo que se mova
e, entre tanto, Personagem
tenta passar intato:
segue sua forma de ser.
Na reflexão da reta estica o caminho,
na flexão da curva abre via.

Ilha

Há um momento
que é também um ponto:
o que se encontra vivo é o sentimento
do nada.
Há um momento em que Personagem se sente
o ponto de encontro
do nada com o nada.
Neste ponto lhe falta o sentimento do tempo.
Neste nada se sente um mínimo,
um átomo, um quase...
Só sua consciência
o diferencia do vácuo.
É o vértice das coisas
perdidas.
Perde a estatura da luta,
seu rumo é o abandono da rota.
Neste ponto o momento também é parado.
Sente rachar sua base...
Fora da concha um mar de ausências,
navios vazios, caminhos ao largo.
Vindo de antes, indo adiante,
o sol,
o sal que o salva.




FELIZ ANIVERSÁRIO
por Adenor Nunes

- Feliz aniversário, amor!
- Não precisava, querido.
- Você acha que eu não daria presente pra minha namorada?
- Ah, meu bem.
- Tenho certeza que você vai ficar muito feliz!
- Claro que sim.
- Você var dar pulos de felicidade!
- Ai, não consigo abrir essa embalagem.
- Vou te ajudar. Pronto.
- Hummm.
- Gostou?
- É.
- Como assim “é”?
- Achei legal.
- Legal?
- Sim.
- Você está louca?
Não era tudo que você queria?
- Digamos que só existe um pequeno probleminha com seu presente.
- Não venha me dizer que existe probleminha.
Entrei na loja e falei: “Meu amigo, o que todas as mulheres gostariam de ganhar?”
- O problema é que não sei qual é a utilidade desse objeto.
- Ora! O vendedor me explicou que é a nova moda entre as mulheres do mundo todo.
- Meu bem, mas não sei o que é esse objeto.
- É só ler na caixa: um reduplicador elétrico de face tripla.-
E o que é isso?
- Você vai perguntar logo pra mim?
- Você comprou o presente!
- Tudo bem, eu também não sei pra que serve. Mas pelo preço que paguei deve ter algum uso.
- Já sei. Vamos ler o manual!
- Perfeito. “Você possui agora um produto de inigualável utilidade ... Nossa empresa possui mais de 30 anos no mercado ... Seu uso é muito simples... Você não terá mais os problemas como aqueles que ocorrem em outros aparelhos” Desisto.
- Vou ligar pra central de atendimento ao cliente.
- Talvez seja a única solução.
- Bom dia, acabei de comprar um produto de vocês e não sei como usar. O que? O número é 9807-8987-09876. Você só elucida defeitos do aparelho? Mas como eu vou saber se tem algum defeito se eu não sei como usar? Você também não sabe? Desisto
- Perdão, querida. Amanhã, eu compro outra coisa pra você.
- Não precisa, amor. Você já gastou muito com o meu reduplicador elétrico de face tripla.
- Então, vamos comemorar seu aniversário no novo restaurante que abriu no Leblon?
- Qual?
- Olha no jornal: o mais novo restaurante do Leblon é especializado em comida Tralkilk.
- Comida Tralkilk? O que é isso?
- Acho melhor a gente ficar em casa!



por Marcelo Ricardo


Pedido Manso
-Traz o Mozart.


Súplica musical
-Leva Ravel...

O pequeno príncipe
livre
servil

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