Ex-namorada
por Cassiano do Amaral

-Que camisa amarela é essa, Carlos Roberto?
-Bom... eu... é...
-Não gagueja! Você sempre gagueja quando tenta mentir! Foi você que comprou essa camisa? Quantas vezes eu vou precisar repetir que você fica péssimo de amarelo?!
-Mas eu não comprei. Eu ganhei.
-Como assim “ganhou”? Eu nunca te vi com essa camisa. Aliás, até onde eu sei você não costuma ganhar presentes de ninguém...
-É que faz tempo que eu não uso... mas se você quiser eu posso tirar...
-Não adianta tentar me enrolar, Carlos Roberto, quem te deu essa camisa? Você tem uma amante? É isso? Você tem uma amante?
-Eu...
-Desembucha antes que eu pegue as minhas coisas e suma por aquela porta!
-Eu ganhei da minha ex-namorada, pronto, tá satisfeita?
-Não acredito que você ainda fica usando presentinho que recebeu daquela vigarista!
-Mas o que é que tem, meu amor? É só uma camisa... Se você quiser eu tiro, ou melhor, jogo fora. Pronto, vou jogar fora e não se fala mais nisso.
-Não adianta, se você ainda usa os presentes que ela te dava é porque você ainda ama essa mulher...
-Não seja injusta...
-Tá vendo, se você me amasse de verdade você negaria até a morte que ainda gosta dela!
-Tudo bem, eu nego até a morte, eu não gosto mais dela! Eu amo você!
-Mentira! Você só está dizendo isso porque eu pedi! Na verdade, você não consegue esquecer essa maldita ex-namorada!
-Pára com isso, meu amor, deixa de ser ciumenta... eu nem tenho certeza se foi realmente ela quem me deu essa camisa...
-Você deve ter tido tantas mulheres que nem se lembra, né, seu safado? Aposto que deve guardar todas as cartinhas, bilhetilhos, presentinhos... provavelmente misturados com os presentes que eu te dou... não sei como pude me enganar por tanto tempo!
-Eu nunca te enganei, nunca!
-Tá vendo como eu tenho razão! Você nunca me enganou, mas também nunca me disse que era um cafajeste! Já nem duvido até que seja um pervertido sexual! Aposto que quando vai pra cama comigo ainda pensa nela...
-Você só pode estar enlouquecendo... eu só penso em você, meu amor, só em você...
-Como pode mentir com a cara mais deslavada... Pára com isso... olha, que tal a gente assistir uma peça hoje a noite? Depois eu prometo que te levo naquele restaurante que você adora!
-Peça? Você sabe que eu detesto teatro! Aposto que a outra devia te acompanhar em todos esses programinhas chatos que você inventa...
-Tudo bem, eu deixo você escolher o programa! Mas desde que você faça as pazes comigo, combinado?
-Você tá achando que eu me vendo assim barato? Eu sou uma mulher de valores!
-Eu nunca duvidei disso, meu amor... mas, qual o seu valor, quer dizer, o que eu posso fazer para que você faça as pazes comigo?
-Deixa eu pensar... eu quero que você me conte todos os presentes que você já recebeu de ex-namoradas.
-Essa não vale, tem que ser outra coisa!
-Por que tem que ser outra coisa? Eu quero que você me conte tudo que já recebeu de ex-namoradas! Quero também que me diga o nome de cada uma delas e a data em que cada uma te deu o presente.
-Tem certeza que você quer ouvir isso?
-Tenho!
-Depois não diz que eu não avisei, posso começar?
-Pode não, deve. Chega de fazer papel de palhaça! Quero que você comece da última ex-namorada até a primeira.
-Tudo bem então. Lembra daquela gravata de seda italiana e daquelas abotoaduras?
-Como você pôde se confundir? Fui eu quem te deu a gravata de seda e as abotoaduras quando completamos dois anos de namoro!
-Então, você não pediu que eu começasse pela última ex-namorada? Resolvi começar pela atual...