Personagem - parte 3
por Aguinaldo Ramos

Raiz

Sabedor de seus valores,
minimamente ciente das estruturas do mundo,
ainda assim Personagem
não preenche de todo os vazios
da mente.
Acostumado às minúcias
sua sede não é mitigada pelo encontro
com as margens da fonte dos fatos.
Ali, o que desabrocha cria beleza:
é o mais puro destino dos fatos em flor.
As muitas trincheiras das coisas confusas
apenas protegem (ou sufocam)
o óbvio, ou o belo, ou o bom.
No alvo da mira, o amor.
Quem tem a postura correta
e o instrumento adequado
(ou, no inverso de tudo,
a paixão pelo alvo e a certeza na mira)
registra (ou já tem registrado)
sempre a presença
de algo mais belo
do que é líquido ver...

Gana

Completo,
não há quem seja.
Profunda ilusão...
Há quem tente ser o todo,
ser tudo para todos,
impor a pretendida perfeição
aos desavisados,
aos tímidos,
aos pequenos,
aos fracos
aos que não querem ser perfeitos...
Quem sabe de si põe na mesa
os melhores humores
e bebe à saúde.
Nas bochechas o sorriso
nos dentes o gosto
nos braços o embalo,
a fome de vida no ventre.
Se preciso, Personagem
conta com as pernas
(e a liberdade)
do povo.
Inteiro esteja o espírito!






Povo

Personagem está atrás da pátria...
Cresce sob estrelas aniquiladas
cercado de riquezas que não alcança
vendo ao longe verdes matas que se vão...
A pátria é decorativa,
até um tanto dramática.
Perdido no cenário
nem sabe ainda seu papel.
Balança firme a bandeira do futuro,
parece um gesto de adeus...
A pátria é um aglomerado de emoções:
um frio na barriga
um gol na decisão
uma notícia
que passa na televisão...
Aprende uma lição moral
(e cínica):
a pátria
está atrás
de Personagem...

Personagem é projeto de livro, com 80 fotos jornalísticas recontextualizadas e ressignificadas pelos textos, contando a trajetória de um “personagem”, que, de todos, pode ser qualquer um.

Veja algo mais de Personagem em: http://www.telemar.com.br/museu/expofoto/persona/personabox.html

* Aguinaldo Araújo Ramos foi repórter-fotográfico por quase 30 anos. Palpiteiro, sociólogo e mestrando em História Comparada, IFCS, tem feito alguns investimentos literários (finalista no Prêmio SESC de Literatura 2005) e está orgulhoso de publicar em Palavril.