A HERANÇA DO PROVENÇAL - 2º parte
por Euclides Amaral


Dedicado a Paulo Henriques Brito, poeta, tradutor e professor da PUC-Rio que inspirou esse texto e a forma como foi feita a classificação das tendências explicitadas.


A nossa tradição de poetas atuantes na música brasileira vem do século XVII com Gregório de Matos Guerra, que já cantava seus versos se acompanhando de uma viola feita de cabaça fabricada por ele, segundo Araripe Júnior, citado por José Ramos Tinhorão no prefácio do livro MPB (Muita Poesia Brasileira) de Leila Míccolis. No século seguinte apareceram muitos outros poetas fazendo o mesmo uso do verso em música., entre eles o modinheiro e poeta carioca Domingos Caldas Barbosa (1738/1800). Até que no século XIX, no auge do Romantismo, surgem as primeiras duplas de compositores como conhecemos hoje: um músico e um poeta como letrista. Parcerias como Xisto Bahia e Melo Moraes Filho (ascendente de Vinicius de Moraes). O músico português Rafael Coelho e o poeta criador do Romantismo Gonçalves de Magalhães. Vários outros poetas deste mesmo século enveredaram pela música popular: Catulo da Paixão Cearense, Laurindo Rabelo, Vilela Tavares e Joaquim Manuel de Macedo. No século XX, esse frisson pela letra da canção veio a desaguar em Mário de Andrade (que na sua polivalência também era músico), Manuel Bandeira (parceiro de Jaime Ovalle e Villa-Lobos), Dora Vasconcelo, Dante Milano, Oreste Barbosa, Otavio de Souza e Ferreira Gullar (quase todos parceiros de Villa-Lobos) e no que mais se enfeitiçou pela carreira de letrista: Vinícius de Moraes. Já há algum tempo, a partir das décadas iniciais do século XX, a questão da influência da mídia fonográfica no trabalho dos poetas-letristas ficou mais acirrada e mais clara. Com a notoriedade e reconhecimento através da canção popular, o poeta-letrista ou como preferem chamar “compositor-letrista”, tornou-se mais conhecido do grande público. Fruto do trabalho feito nas letras de música, o poeta teve também o interesse do público direcionado para seus livros. Muitos desses livros, além de poemas, trazem também letras de canções com os diversos parceiros. Não querendo dizer que o suporte “livro” para a poesia tornou-se obsoleto ou mesmo ineficiente. Porém, fica bastante claro que a poesia com o suporte musical e fazendo uso das diversas formas de divulgação deste produto ganhou muito mais adeptos. Haja vista a quantidade de poetas-letristas que somente conseguiram projeção através da letra de música e/ou em muitos casos, uma projeção muito maior à nível popular como foi o caso de Vinícius de Moraes, que havia publicado em 1933 (aos 19 anos) seu primeiro livro de poesias: O caminho para a distância. Caso inverso aconteceu com o poeta-letrista Paulo César Pinheiro, que após anos e anos de trabalho de letra de música, publicou seu primeiro livro aos 27 anos “Canto brasileiro” em 1976. A título de curiosidade citarei apenas alguns autores e alguns de seus livros: “Canto brasileiro”, “Viola morena” e “Atabaques, violas e bambus” de Paulo César Pinheiro; “Tropicalismo para principiantes” e “Os últimos dias de Paupéria – Do lado de dentro” (póstumo) de Torquato Neto; “O tempo da busca” e “ Memórias do boi Serapião” de Carlos Pena Filho; “Inquisitorial” de José Carlos Capinam; “Punhos da serpente”, “Palávora” e “O beijo da fera” de Salgado Maranhão; “O surfista no dilúvio” de Sergio Natureza; “Asas” e “Mundo delirante” de Abel Silva; “Canção de Búzios” de Ronaldo Bastos; “Poemas & canções” de Ana Terra; “A palavra cerzida”, “Mar de mineiro”, “Segunda classe” e “Beijo na boca” de Cacaso; “Urucum X fumaça”, “Pipa”, “Trincheira de espelhos” e “Poeta vagabundo” de Xico Chaves; “Cemitério geral”, “Casa de pássaros”, “Caminho do meio” e “3X4” de Ivan Wrigg; “O gavião e a serpente” de Murilo Antunes; “Na busca do Sete-estrelo”, “Verão vagabundo”, “Piquenique em Xanandu” e “Por mares nunca dantes” de Geraldo Carneiro; “Motor” de João Carlos Pádua; “A marca do Zorro” de Tite de Lemos; “O canto do homem cotidiano” e “Tapete do tempo” de Ildázio Tavares; “Me segura que eu vou dar um troço” de Wally Salomão; “Um cara bacana na 19ª” de Aldir Blanc; e ainda diversos poetas como Hermínio Bello de Carvalho, Chacal, Bernardo Vilhena, esses três com vários livros publicados.

Alguns poetas enveredam por outros gêneros literários ou mesmo vieram de determinados gêneros e navegaram na canção popular: Sérgio Cabral (biografia); Nei Lopes (pesquisa: O samba na realidade); Paulo Coelho (misticismo); Abel Silva (romance “Afogados”, contos “Açougue das almas); Oduvaldo Viana Filho (teatro); Guarniere (teatro); Ruy Guerra (cinema); Luiz Galvão (memórias) e Márcio Borges (memórias).
Há outros que pouco se sabe de seus livros, contudo, seus nomes estão sempre atrelados a grande músicos-compositores. Suas letras com tal envergadura literária suprem o nosso afã de conhece-los em livros, nomes como Fernando Brant, Vítor Martins, Paulo César Feital, Ronaldo Monteiro de Souza, Lula Freire, Antônio Cícero, Antônio Risério, Duda Machado, Fausto Nilo, Fernando de Oliveira, Paulo Emílio, Climério e Jorge Salomão, dentre muitos outros, muitos deles com livros publicados.

Há o caso de poetas consagrados que se deixaram levar nas asas leves da canção popular, seja colocando letra em música ou mesmo cedendo seus poemas para serem musicados: Carlos Drummond de Andrade, Affonso Romano de Sant’Anna, Haroldo de Campos, Augusto de Campos e Ferreira Gullar.

AS GERAÇÕES DE LETRISTAS

A título de curiosidade citarei apenas alguns letristas que compõem as diversas gerações, sendo as mais recentes, as que atuam a partir da década de 1960. É claro que muitos letristas ficarão de fora, isto por vários fatores: esquecimento, a falta de conhecimento da obra de certos letristas etc. As datas do início do trabalho como letrista também não são exatas e sim aproximadas.

1ª Geração: (a partir de 1840)

Albuquerque Medeiros, Álvares de Azevedo, Araújo Porto-Alegre, Arthur de Azevedo, Bastos Tigre, Bernardo Guimarães, Casimiro de Abreu, Castro Alves, Catulo da Paixão Cearense, Francisco de Paula Brito, Gonçalves de Magalhães, Gonçalves Dias, Joaquim Manoel de Macedo, Laurindo Rabelo, Leopoldo Fróes, Machado de Assis, Melo Moraes Filho, Olavo Bilac, Pedro de Alcântara, Tomás Antonio Gonzaga e Vilela Tavares.

2ª Geração: (a partir de 1910/1930)

Álvaro Moreira, Antônio Maria, Dante Milano, David Nasser, Dora Vasconcelos, Elano de Paula, Goulart de Andrade, Grande Otelo, Guilherme de Brito, Guimarães Passos, Hermes Fontes, Jair Amorim, João de Barro, Joracy Camargo, Manuel Bandeira, Mário de Andrade, Mário Lago, Mauro de Almeida, Olegário Mariano, Orestes Barbosa, Osvaldo Santiago, Otávio de Morais, Otavio de Souza, Renê Bittencourt e Vinicius de Moraes.

3ª Geração: (a partir de 1960)

Afonso Romano de Santana, Augusto de Campos, Cacaso, Carlos Drumonnd de Andrade, Carlos Pena Filho, Chico Anísio, Clóvis Mello, Fernando Brant, Ferreira Gullar, Glauber Rocha, Gianfrancesco Guarnieri, Haroldo de Campos, Hermínio Bello de Carvalho, José Carlos Capinam, Lula Freire, Márcio Borges, Mário Telles, Nelson Motta, Nuno Veloso, Oduvaldo Viana Filho, Patativa do Assaré, Paulinho Tapajós, Paulo César Pinheiro, Paulo Gracindo Júnior, Paulo Sérgio Valle, Ronaldo Bastos, Ronaldo Bôscoli, Ronaldo Monteiro de Souza, Ruy Guerra, Vandenberg Dantas de Souza, Torquato Neto e Waly Salomão.

4ª Geração: (a partir de 1970)

Abel Silva, Acyr Marques, Alcino Correa (Ratinho), Aldir Blanc, Ana Maria Baiana, Ana Terra, Antonio Bivar, Antônio Cícero, Antônio Risério, Arthur de Oliveira, Cláudio Ribeiro, Climério, Délcio Carvalho, Duda Machado, Ezequiel Neves, Fausto Nilo, Geraldo Amaral, Geraldo Carneiro, Ildásio Tavares, Ivan Wrigg, João Carlos Pádua, Jorge Portugal, Jorge Salomão, José Jorge, José Miguel Wisnik, Luiz Cláudio Tolomei, Luiz Galvão, Marco Aurélio, Marília Trindade Barboza, Murilo Antunes, Nei Lopes, Olívia Hime, Paulo César Feital, Paulo Coelho, Paulo Emílio, Regina Werneck, Rogério Duarte, Salgado Maranhão, Sérgio Cabral, Sérgio Fonseca, Sergio Natureza, Tite de Lemos, Vitor Martins, Xico Chaves e Ziraldo.

5ª Geração: (a partir de 1980)

Alice Ruiz, Álvaro Maciel, Anamaria, Antônio Martins, Arnaldo Antunes, Bernardo Vilhena, Bráulio Tavares, Bruno Levinson, Carlos Caetano, Carlos Costa, Carlos Rennó, Cazuza, Célio Khouri, Celso Borges, Chacal, Charles, Chico Amaral, Chico Assis, Chico Pereira, Claufe Rodrigues, Costa Netto, Cristina Latini, Cristina Saraiva, Dudu Falcão, Dulce Quental, Edu Planchez, Ele Semog, Elisa Lucinda, Euclides Amaral, Fausto Fawcett, Fernando de Oliveira, Fernando Pires Alves, Flávio Nascimento, Francisco Bosco, Fred Góes, Guile Wisnik, Guilherme Godoy, João de Jesus Paes Loureiro, Kate Lyra, Kico Amaral, Ledusha, Luiz Alfredo Milleco, Luiz Carlos Góes, Luiz Carlos Máximo, Luiz Coronel, Lula Dimoraes, Manoel de Barros, Manu Lafer, Marcelo Dolabela, Marcelo Paes, Marceu Vieira, Marcio Paschoal, Marcos Sacramento, Mariana Blanc, Mário Lago Filho, Mauro Aguiar, Mauro Mendes, Mauro Santa Cecília, Mônica Tomasi, Patrícia Travassos, Paula Toller, Paulo Leminski, Pedro Landim, R. R. Juca, Rita Altério, Ronaldo Santos, Silvia Sangirardi, Tanussi Cardoso, Tavinho Paes e Zé Edu Camargo.


Certa vez, João Cabral de Mello Neto disse que Vinícius de Moraes tinha negado a poesia quando começou a fazer letra para música. João Cabral estava quadradamente enganado. Vinícius de Moraes apenas mudou de forma a sua poesia e não há como negar a contribuição dele para o nosso cancioneiro popular, assim como a de todos esses poetas que enfeitam a nossa música popular com seus versos e sendo assim, aprimoram-se também em uma escola tão rica em forma e conteúdo.

Para finalizar cito Augusto de Campos e um estudante japonês via-poundiana: “Independente de quaisquer tendências ou ismos, a poesia é uma família dispersa de náufragos bracejando no tempo e no espaço e consiste em essências e medulas”.

* Euclides Amaral é poeta e letrista
euclidesamaral@oi.com.br

3 Comments:

At agosto 07, 2006 12:36 AM, Anonymous Anônimo said...

Opa... Não é o formato, não é o formato... Muito extenso. Não li, e nunca vou ler! Pelo menos, não num blog. Só um toque de amigo. Só não diga que fui eu que te avisei. Waldeck.

 
At março 06, 2007 6:03 AM, Anonymous Anônimo said...

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